Cláudia Feltrin
2 min readDec 18, 2019

06:17

sinto falta das borboletas e de escrever e de quando esse lugar girava mais devagar mas sinto muita falta de quando não doía tanto assim de quando prestava mais atenção nos pássaros e essa cidade não me queimava os olhos. parece que tá tudo curto indigesto hermético demais e eu sigo aqui consternada em entender esse reflexo que me olha de volta como quem perdeu o que restava de validação. nem eu entendo. ontem precisei parar pra respirar. o coração tem cerrado descompassado e eu posso jurar que quase sinto isso que serpenteia nas veias fustigando pra sair. já não sei se é tristeza ou se o universo resolveu me esvaziar de mim. tem tempo demais que venho encarcerando essas nervuras pra não beliscar de tudo que me pesa mas e se é dessa ignorância que me reconstruo despovoada? já me perdi das minhas cidades dos que me habitavam e dos medos que jurei enterrar no quintal de casa por querer entender como carcaças quando se eram raízes. essa terra não aceita finados com pendências e desses mortos-vivos não sei se me desfaço. tá tudo nas esquinas nas paredes nos espelhos e eu só me deixo assombrar. o foda é que tá confortável demais. que já virou costume não olhar nos olhos. e viver de medo é tragar dessas vias de pedra aqui mesmo. não lembro da última vez que andei sem tropeçar. e que me habitei. e que me vi parte desse reflexo. e que não doeu esse tanto. mas dessa vez é minha: essa distância do esqueleto como se me percebesse de cima. como se essas pernas não me carregassem mais e esse caminho não tivesse tantas esquinas. até as madrugadas pediram por despejo. num desses tropeços rezo pra voltar pro corpo, mas até lá

fujo pra ver se deixa de doer